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Zonas de ilusão

Atualizado: 30 de out. de 2023


"Impressão, nascer do sol" de Claude Monet (1872)
Meu nome é Rafael Santos Barboza, sou psicólogo (CRP 06/142198) e psicanalista, atuando com atendimentos de forma remota/online. Nesse texto, apresento a ideia de que a ilusão não deve ser vista apenas como um erro cognitivo, mas também como um componente essencial para a vida, uma espécie de força criativa.

Texto: Há uma ideia de comum de que alguém "Iludido" não consegue enxergar a realidade "assim como ela é". Isso implica uma noção frequente de que o sofrimento seria um erro cognitivo. No entanto, há uma diferença enorme entre alienação e ilusão. Diferente da alienação, que dessubjetiva, a ilusão também pode ser um espaço de resgate do que há de mais criativo no sujeito.


Desiludir-se, por exemplo, nem sempre é "voltar à realidade", mas muitas vezes saltar entre extremos: da ilusão da grandeza à autodepreciação, da onipotência ao carimbo de fracasso completo, da moralidade rígida à culpa corrosiva.


A clínica psicanalítica, por certo ângulo, também é uma tentativa de abrir a linguagem, trazendo novas possibilidades de nomeações para aquilo que está aprisionado em termos técnicos ou de uso muito frequente. Para expressões como "eu sou ansioso", um aspecto importante da análise é criar espaços para que isso se desdobre: o que essa ansiedade desperta, de que outros modos esse sentimento poderia ser nomeado, se a palavra ansiedade não existisse?


Com a ilusão, que, no geral, costuma ter uma conotação negativa,também é importante trabalhar esses sentidos. Mais do que uma substância nociva, a ilusão talvez seja um componente essencial para amar, trabalhar, ser criativo.


No início da vida, por exemplo, Winnicott fala dessa ilusão como criação do mundo, que é proporcionada pela identificação das figuras de cuidado com as necessidades da criança. Esse elemento ilusório, aos poucos, vai se diluindo para dar lugar a uma relação mais objetiva com as pessoas e com o ambiente (o autor vai falar em objetos objetivamente percebidos).


No entanto, essa ilusão inicial seria essencial e, em parte, necessita de certa conservação. Há um tipo de ilusão mais defensiva, utilizada para mascarar situações que o sujeito não dá conta. A queda da ilusões defensiva costuma ser muito dolorida do ponto de vista psíquico. J.D. Nasio (psicanalista argentino), por exemplo, fala de um tipo de depressão que se trata, na verdade, de um "transtorno de desilusão", em que as alterações de humor são consequências dessas quedas: ilusão de ideais, de família, de sucesso (e quanto maior a ilusão, mais dura a queda poderia ser).


Mas há também uma ilusão propulsora e construtiva, que traz notícias do que há de mais original em cada um, como no verso do da poesia de Manoel de Barros: "Há histórias tão verdadeiras que às vezes parece que são inventadas". A ilusão, nesse contexto, pode ser mais uma possibilidade de abertura do que fechamento.

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