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"Lili: Novela de um Luto" (Resenha)

Meu nome é Rafael Santos Barboza, sou psicólogo (CRP 06/142198) e psicanalista, atuando com atendimentos de forma remota/online. Nesse texto, apresento falo sobre o livro "Lili: Novela de um luto" de Noemi Jaffe.



Tive a ousadia de abrir os olhos dela, e por trás das pálpebras lá estava o olho inteiro, da mesma cor, o mesmo olhar, ainda que ninguém olhasse por trás dele".


Em “Lili”, a escritora Noemi Jaffe fala da relação estabelecida com a morte da mãe. Na mesma medida em que a autora tenta falar a experiência de forma palpável, a perplexidade diante da morte não é negada.


Mais do que o que acaba, o que se faz com o que permanece após a morte de alguém é um grande tema do livro. O enlutado se depara não só com a vida que parte, mas com a vida que fica. Ou seja, um trabalho de luto acerca do que resiste à morte: as memórias, buracos, ditos e não ditos. A diferença entre estar vivo e estar morto também é um fio reflexivo na obra ou, como escreve a autora, "a diferença entre um trovão e  o silêncio".


"Acho que vou passar a ser eu mesma mais um buraco". Trata-se de um buraco também como novo espaço de cultivo. A dificuldade de lidar com a morte, muitas vezes, diz respeito a um modo de vida em que "vivemos apartados da dor, da doença e de todos os buracos possíveis".


O trabalho do luto, na psicanálise, envolve certo nível de aceitação de ciclos. O que se perde dentro de cada um quando se perde alguém é totalmente singular. Não à toa, a expressão “trabalho do luto” costuma ser utilizada. Trata-se de um dispêndio de energia psíquica, razão pela qual o enlutado necessita contar com o fator tempo.


Como lidar, então, com as lembranças de alguém que foi embora, mas que, ao mesmo tempo, habita o "corpo e a memória" de quem ficou? Em “Lili”, a relação da mãe enquanto sobrevivente da guerra também se vê alterada nos últimos dias de vida: "Algumas vezes chegou a me dizer que sofria com a guerra mais agora do que quando a guerra realmente aconteceu”.


A escrita também é uma maneira de dar moldura aos movimentos afetivos. Um processo não só de rememoração, mas de transformação. Um reacerto que implica em voltas, mudanças, não sendo um processo linear e uniforme ou, sequer, completo: "E existe ainda uma aceitação existencial, que oscila: aceito, não aceito”.

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